O tempo não conseguiu apagar as imagens de África. A lembrança dos cheiros e das cores continuam presentes nessas imagens que a memória retém. Do cheiro a peixe no velho saco de mateba do velho pescador, o Miguel, tez negra, carapinha e barba brancas, vestido com panos às riscas coloridas, pés descalços "pelas barrocas" que o traziam da praia, a quem a mãe comprava o peixe acabado de pescar no mar, ali tão perto. Do tom vermelho daquelas barrocas que calcorreávamos em liberdade, ao calor do sol abrasador, para irmos tomar um banho ao mar, sob o olhar atento da mãe que nos vigiava discretamente lá de cima, da varanda de casa. Do morro da Samba que avistávamos lá de casa. Da sua encosta virada ao mar, a mais íngreme, que parecia querer projetar-se sobre a estrada junto à praia. Daquele extenso morro vermelho, das ossadas humanas que encontrávamos por lá!... Ouvia-se dizer que eram de soldados do tempo da Guerra Mundial. E qual delas? E seriam? Subíamo-lo, numa lufada, pelas barrocas que ficavam voltadas para a nossa casa, manhã cedo, em tempo das férias escolares dos irmãos mais velhos, farnel farto para todo o dia, a velha tenda de campanha às costas do mano responsável, o Mocho. Já no cimo, tenda armada, abancávamo-nos à sombra dela e comíamos o farnel para, à hora do almoço, sob o olhar incrédulo da mãe, nos prantarmos de volta a casa... para almoçar!